domingo, 25 de dezembro de 2011

Ciganos Banjara ....




issão na Ásia: Índia

    A Igreja no Brasil aberta ao mundo

    N° 250 - Maio 1997 - pág. 33




(Fragmentos do artigo do Padre Renato Rosso).
"Estou a cerca de oitenta quilômetros de Jaipur, no norte do Rajastão, Índia, no meio da mata. Os arbustos maiores não passam de dois metros de altura, e tudo aqui é seco. As árvores foram derrubadas, e a vinte quilômetros já começa o deserto, que entra pelo Paquistão adentro.
Os Banjara fizeram dessas colinas um ponto de referência para o grupo. Mulheres, crianças e alguns homens se fixam por aqui, enquanto outros, jovens e adultos, procuram trabalho nas cidades e aldeias vizinhas. Depois de um tempo retornam. É hora de revezamento. Outros assumem a tarefa
Dizem que tigres e serpentes são comuns nessa região, mas os ciganos sabem como se defender. Cães amestrados prestam uma boa ajuda. 
No passado, esses grupos de ciganos eram conhecidos como os "senhores da estrada". Andavam de um lugar para outro, atravessando rios e florestas. Como? Só Deus sabe. 
Percorriam a Índia inteira, chegando até o Oriente Médio, para depois retornar. Atravessavam reinos inimigos entre si. Para se ter uma idéia, só o Rajastão era dividido em pelo menos cem pequenos reinos. 

Os ciganos dispunham de um salvo-conduto especial para atravessar uma determinada região. É que todo mundo precisava do trabalho deles. 
De fato, eles transportavam mercadorias, serviam de "correio" para as longas distâncias e eram também os banqueiros dos grandes senhores - podiam comprar ouro e trocá-lo por bens de consumo ou dinheiro. 
Muitas vezes, o ouro e os objetos preciosos não eram carregados por eles em suas longas viagens. Preferiam enterrar tudo em lugares secretos. No momento certo, sabiam qual caixa-forte abrir para fazer os seus negócios. 
Engana-se quem pensa que os Banjara se deslocassem em grupos de apenas algumas dezenas de famílias. Grupos de até 3 mil homens (sem contar as mulheres e as crianças) eram uma coisa normal.


Os Banjara nunca faziam guerra. Como outros grupos ciganos semelhantes, durante uma guerra, podiam ser recrutados para ajudar um determinado exército, mas nunca para o combate. Ficavam na retaguarda, prestando às tropas todo tipo de serviço necessário. Em caso de derrota, nada sofriam, porque todos reconheciam o seu valor social.
Outras atividades importantes eram a música, a dança, a acrobacia e o teatro nas cortes dos reis ou para os soldados.



Hoje, podemos encontrá-los aos milhões em periferias anônimas, pobres, às vezes miseráveis. Dignidade suficiente, porém, não lhes falta, numa sociedade que mudou muito desde os tempos em que eles eram reis das estradas, rios e florestas.
Gostaria ainda de lembrar os Hakkipikki, um povo de caçadores do centro-sul do país. Ou também os Gadha Lohar, que trabalham com metais. Ou os Rabari, pastores de ovelhas, cabras, gado e camelos. Ou, ainda, os Korwas...
Alguns Korwas deixaram de ser pastores para fabricar pulseiras, colares e especialmente coroas. Em seus acampamentos, todos fazem coroas: mulheres e homens, jovens e crianças. Coroas para hinduístas, muçulmanos e cristãos, vendidas nas portas dos templos, mesquitas e igrejas.
É difícil falar de escola com eles, já que as crianças trabalham na produção de coroas.
Gostaria também de falar sobre os Kalibilias, os Nat e os Bopas, que são dançarinos, músicos, acrobatas, de circos."


EXTRAÍDO DA Revista :Sem Fronteiras

 AUTORIA DO ARTIGO:
 Padre Renato Rosso, 52 anos, missionário italiano, trabalha há mais de três décadas com o povo cigano. Viveu no Brasil, de 1984 a 1992, e atualmente acompanha os ciganos no Bangladesh e na Índia.(Esta pequena biografia do padre não foi atualizada).



sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

O flamenco



Toda a pesquisa para encontrar uma origem única do Flamenco parece não nos levar a lugar nenhum. O mais provável é que tenha se formado ao longo dos anos graças à miscigenação cultural de diferentes povos que habitaram a Península Ibérica, particularmente a Espanha, que é, há mais de duzentos anos, considerada a pátria do Flamenco.
  • gitanos

Chegaram em 1425 e fixaram-se em várias regiões, especialmente em Andaluzia que foi onde houve uma maior sintonia com a população autóctona que lá se encontrava. As origens do cante aparecem extremamente relacionadas às regiões da Andaluzia onde as gitanerias foram importantes. As gitanerias eram um núcleo urbano com importante presença cigana, mas também se usa o termo para expressar a qualidade que faz referência aos ciganos na forma de interpretar o flamenco.
  • árabes

711 a 1492
Ocuparam vasto território espanhol, principalmente a Andaluzia, por onde entraram e também por onde partiram. Essa foi a região da Espanha onde se deu a maior influência da cultura árabe que por ali deixou um imenso legado, e, por isso mesmo, acredita-se que muitas das manifestações culturais desta região seja de origem árabe, entre elas, o Flamenco. Por outro lado, a chamada música andalusi foi levada pelos mouros expulsos da Espanha ao norte da África e lá desenvolvem seqüelas musicais. Em 1922, o compositor espanhol Manuel de Falla comenta:
"... o que não deixa sombra de dúvida é que a música que ainda se conhece em Marrocos, Argel e Tunez com o nome de música andaluza dos mouros de Granada, não apenas guarda um caráter peculiar que a distingue de outras de origem árabe, como também em suas formas rítmicas de dança reconhecemos facilmente a origem de muitas de nossas danças andaluzas: sevilhanas, zapateados, seguidillas etc."
O musicólogo Lothean Siemens explica que o cantar a lo flamenco não é só do flamenco, mas um fenômeno muito antigo, muito espanhol. Muitos acreditam que ele seja de origem árabe, ao passo que os árabes acreditam ser de origem andaluza. Eles fazem diferença entre a música árabe pura, que é oriental, e a andalusí, que é do norte da África Ocidental. Tanto o Flamenco como a música árabe pertencem a um amplo espectro de correntes musicais que integram o chamado orientalismo musical e a semelhança entre ambas é inegável, contudo o que mais chama a atenção é que em ambas o melisma — várias notas numa mesma sílaba — é um signo comum e característico.
  • mouriscos

São os mouros e descendentes árabes que permaneceram clandestinos na Espanha depois da expulsão dos árabes.
Blas Infante, chamado de "o pai da Andaluzia", formula a hipótese de que este povo teria se misturado aos grupos de gitanos e outros marginalizados sociais para passar desapercebidos. É uma hipotése que deve continuar sendo investigada, mas se vem daí o cante, por que ele não teria surgido em outras regiões onde os mouros foram até mais numerosos, como Valencia, Aragão ou Castilha? Parece que em Granada eles também formaram um grande núcleo, mas no resto da região da Andaluzia não, portanto, ainda pairam dúvidas sobre se teriam os mouros participado da criação do Flamenco.
  • judeus

Outra influência muito comentada no Flamenco é a dos Judeus. Já gozou de grande repercussão com base no artigo publicado em 1930 pelo escritor israelita Máximo José Khan, pseudônimo de Medina Azara. Neste artigo, ele relaciona as origens do cante com os marranos ou judeus convertidos ao cristianismo. Apesar desta teoria já ter sido francamente questionada, não se pode negar a semelhança que há entre alguns cantes hebreus com o cante jondo.
"À semelhança dos ciganos, os judeus não criaram o cante flamenco, mas colaboraram em sua conservação junto com os andaluzes e os murcianos e há pelo menos dois cantes cuja procedência judia será dificilmente negada, as antigas saetas (pura liturgia sinagogal) e a petenera. Mairena e Molina perceberam ecos do cante sinagogal em algumas seguiriyas e também nas saetas, aparentadas com o Kol Nidrei (jondo hebreu), é cantado especialmente pelos sefaraditas, os judeus de origem espanhola, e que nos leva a pensar que o Nidrei imita o jondo e não o contrário.
  • outras influências

Mais duvidosas, porém possíveis, e algumas inclusive prováveis, e acima de tudo lógicas em um território que foi encruzilhada privilegiada de culturas relevantes de cada período histórico, desde a legendária Tartessos - império semilegendário da Espanha antiga, que compreenderia a atual Andaluzia, e Levante até o norte de Alicante. Desaparecem em mãos dos Cartagenenses, em 500 a.c.; até os sete séculos de dominação muçulmana; árabes, moriscos, judeus, músicas litúrgicas etc.

Excertos sobre a origem do Flamenco

 
  • Felix Grande:
"Camardería de la desdicha; una suerte de solidariedad espontânea que funcionó en lo momentos má dramáticos de la represión contra los gitanos, a quienes muchos andaluces payos pobres dieron cobijo."
"El cante flamenco és una expresión musical que arrastra una mezcolanza tal de voces que ni es paya, ni gitana, ni morisca, ni andaluza. Ninguno de estos pueblos tiene la primacía o monopolio del flamenco."
  • José Manuel Caballero Bonald:
“El flamenco vendría a resultar de una fusión entre gente que compartían, o tenían en común, modos de vidas similares, un modo semejante de buscarse la vida que facilitó la convivencia hasta el punto que llegó a resultar dificil distinguir a unos de otros."
"É coisa sabida, que depois da expulsão dos judeus e a rendição do último baluarte árabe -- fato que coincide, mais ou menos, com a chegada das primitivas tribos de ciganos à Península -- foi se criando na Espanha do século XVI uns imprecisos agrupamentos sociais, formados por indivíduos de distintas procedências e mentalidades; mouriscos e judeus, gitanos e camponeses sem terras, gente dispersa e errante perseguidos pela inquisição ou fugitivos do desterro ou clandestinidade.
"É muito possível que, efetivamente, a etnia gitana propriamente dita não se arraigasse na Espanha senão através dessas fusões e que entre nós, tenha se dado por extensão o nome de gitanos aos supostos cruzamentos destes com aquelas famílias de deserdados de fugitivos do Santo Ofício e dos tribunais civis. Uns e outros devem ter se juntado — por motivos, às vezes contraditórios — na desgraça comum, e a mesma sociedade que os expulsou de seu seio, tenha fomentado neles a vagabundagem e a violenta luta pela vida.
"Logicamente, esses grupos heterogêneos de foras-da-lei, aos quais foram se juntando outras vertentes sociais, acabaram fundindo num mesmo cadinho suas antigas formas de cultura, intercambiando atavismos de suas respectivas histórias sociais.
“De toda esta longa tradição resultaria uma voz personalíssima e profunda, a alma da Andaluzia que se pronuncia em sua canção mais genuína e começa a gestar-se na mais profunda de suas dimensões: o cante flamenco.”




Latcho Drom - (Tony Gatlif)